sábado, 18 de maio de 2013

Micrópolis II


Quando eu era criança me lembro de ter as palavras presas ao dicionário e os assuntos  sempre disponíveis nas enciclopédias como figuras gravadas na pedra. Bastava consultar um mapa para saber a direção dos caminhos e os limites das fronteiras. Hoje não há mais limites visíveis nem fronteiras fixas e o meu dicionário possui prazo de validade. Ganhei de um amigo um Petit Larousse  que, a confiar na data de fabricação,  não deve mais conter os significados atuais e correntes das palavras. Portando, não devo mais consultá-lo. Os oráculos não são mais confiáveis. Devo doar meu Baltasar Gracián. Não cabem mais aconselhamentos nos bolsos, apenas um tablet de sete polegadas para me manter constantemente atualizado e em contato com os rostos que jamais contemplo e muitos, talvez, nunca reveja. A terra precisa ser constantemente atualizada, navegar com o gps não é preciso. Viver nunca foi preciso. Nenhuma terra nova a desbravar, nenhuma aventura. O destino é como um traço que muda constantemente de direção e elabora figuras imprevisíveis. Não tenho mais nenhum livro de referência, nenhuma teoria que dê conta de me orientar na travessia. Embora tudo tão visível e tão absolutamente controlado, nada determinado ou definido. Daí a impressão de aventura impressa na banalidade do cotidiano.