Quando eu era criança me lembro de ter as palavras presas ao
dicionário e os assuntos sempre
disponíveis nas enciclopédias como figuras gravadas na pedra. Bastava consultar
um mapa para saber a direção dos caminhos e os limites das fronteiras. Hoje não
há mais limites visíveis nem fronteiras fixas e o meu dicionário possui prazo
de validade. Ganhei de um amigo um Petit Larousse que, a confiar na data de fabricação, não deve mais conter os significados atuais e
correntes das palavras. Portando, não devo mais consultá-lo. Os oráculos não
são mais confiáveis. Devo doar meu Baltasar Gracián. Não cabem mais aconselhamentos
nos bolsos, apenas um tablet de sete
polegadas para me manter constantemente atualizado e em contato com os rostos
que jamais contemplo e muitos, talvez, nunca reveja. A terra precisa ser
constantemente atualizada, navegar com o gps não é preciso. Viver nunca
foi preciso. Nenhuma terra nova a desbravar, nenhuma aventura. O destino é como
um traço que muda constantemente de direção e elabora figuras imprevisíveis. Não
tenho mais nenhum livro de referência, nenhuma teoria que dê conta de me orientar
na travessia. Embora tudo tão visível e tão absolutamente controlado, nada
determinado ou definido. Daí a impressão de aventura impressa na banalidade do
cotidiano.